Cientistas israelenses desenvolveram um sistema que aprimora o método de identificação de contaminação na água, capaz de monitorar o meio ambiente e reduzir riscos. O detector tem cavidades triangulares, película de prata e dióxido de silício.
A poluição de rios, mares, oceanos, lençóis freáticos e lagoas é uma das crescentes preocupações globais. Resíduos e contaminantes farmacêuticos são um dos principais desafios, especialmente, relacionado com a disponibilidade de água potável. Cientistas da Universidade Bar-llan, de Israel, aperfeiçoaram o processo de identificação de resquícios nocivos na água. Para isso, o grupo desenvolveu um sensor para superfície. Os resultados iniciais do estudo foram publicados, recentemente, na revista Environmental Science Nano.
Os pesquisadores testaram a detecção de resíduos nocivos de piperidina em água pura e etanol. Esse tipo de molécula é pequena e usada na indústria farmacêutica, mas também está presente em alimentos em quantidade não tóxica para o corpo humano. Para a próxima etapa, segundo a orientadora do estudo, Adi Salomon, o grupo quer investigar a aplicação do detector em uma “mistura de moléculas nocivas” em água com o suporte de inteligência artificial (IA) para analisar resquícios na amostra.
O detector desenvolvido pelos cientistas é de base plasmônica, composto por cavidades triangulares e uma película de prata envolta por uma camada de dióxido de silício. O professor de química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Javier Villa explica que sensores plasmônicos “são construídos a partir da geração de uma superfície não estruturada (nesta pesquisa, é rugosa) em escala nanométrica” e “baseados em metais que permitem obter uma resposta óptica que favorece a detecção de moléculas com o aumento do espalhamento inelástico da radiação”. Um exemplo desse tipo de dispositivo é o autoteste de covid-19.
Villa destaca que a propriedade do detector plasmônico desenvolvido pelos cientistas em “aumentar o espalhamento inelástico da radiação” incorporado à técnica de espectroscopia raman intensificada por superfície (SERS, na sigla em inglês) viabiliza a detecção dos resíduos de piperidina em baixa concentração.
A espectroscopia raman permite obter informações por meio do “espalhamento” da radiação eletromagnética incidida no material analisado. O professor de química da Unicamp elucida que o procedimento tornou-se “popular” nas áreas agrícola, médica e de indústria de alimentos por permitir “medidas rápidas e análise direta sem preparo de amostras”.
De acordo com Villa, o diferencial do método aperfeiçoado pelos cientistas da Universidade Bar-llan é justamente o aumento da eficiência da espectroscopia raman para a detecção de baixas concentrações de moléculas nos materiais analisados. O procedimento tradicional está limitado a coletar informações de altas concentrações. “Além da alta sensibilidade dessa técnica para detectar a piperidina, uma das vantagens desse método é poder ser utilizado para a detecção no lugar da coleta de amostra”, diz o professor.
Adi Salomon afirma que a pesquisa começou há alguns anos com um estudante e, há cerca de quatro anos, o doutorando Mohamed Hamode assumiu a liderança do estudo. A orientadora relata que durante o período outros detectores também foram desenvolvidas na universidade, e os cientistas publicarão os resultados “em breve”.
Sobre a pesquisa publicada na Environmental Science Nano, Salomon diz, em comunicado, que “representa um avanço significativo para a área de monitoramento ambiental”. “Ao aproveitar superfícies metálicas com padrões nanométricos, demonstramos que a detecção de baixas concentrações de piperidina na água, usando óptica acessível, oferece uma solução promissora (para o âmbito ambiental)”, completa.
Para Villa, o estudo “abre a possibilidade de implementar melhoras” na técnica de espectroscopia raman intensificada por superfície e “facilita a fabricação de estruturas metálicas em grande escala”. Contudo, o professor de química da Unicamp afirma que precisa ser demonstrado, nas próximas etapas de pesquisa, que o detector pode ser usado em “amostras reais”, como na água de rio.
Brasil
A professora de química da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e pesquisadora do Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais (CDMF) Lucia Mascaro, afirma não haver uma regulamentação nacional no Brasil para detecção e quantização de que nível de resíduos farmacêuticos na água é aceitável ou não. Mascaro explica que o local mais propenso a ter uma contaminação é onde há uma alta densidade demográfica. Também é possível constatar o problema em lugares com extensa criação de gado e grande presença de indústria farmacêutica.
“Degradar fármacos em baixa concentração com os métodos usados para o tratamento de água não é possível. Vamos sempre tomar água contaminada? Não! O problema é que algum desses (fármacos) podem se acumular no organismo ou no ambiente aquático”, diz.
Lucia Mascaro conta que as técnicas comerciais de detecção de contaminantes na água são: cromatografia líquida de alta performance (HPLC, na sigla em inglês), espectrometria de massas (MS, na sigla em inglês) e cromatografia gasosa (CG, na sigla em inglês). Com esses métodos, é possível identificar concentrações baixas de contaminantes e resíduos, mas são caros e necessitam de uma pessoa especializada para fazer a análise das amostras, além da impossibilidade de ser feita no local da coleta.
A pesquisadora afirma haver uma demanda para o aprimoramento de técnicas de detecção de contaminantes e resíduos na água para serem mais rápidos, portáteis e de custo acessível. A especialista relata que, em diversos lugares, inclusive, no Brasil, há pesquisas em andamento para o desenvolvimento de sensores capazes de fazer a detecção no local. “É necessário cada vez mais ter equipamentos que meçam concentrações baixas para que se tome alguma atitude de controle. A outra coisa é saber quais moléculas estão ali. É preciso diferenciar, por exemplo, entre um antibiótico, um anti-inflamatório”, diz.
Villa observa que, na Unicamp, há grupos que trabalham para desenvolver sensores de detecção de amostras ambientais. Por exemplo, há estudos em andamento de detector similar ao da Universidade Bar-llan para a identificação de pesticidas. A equipe do professor de química busca formas de fabricação e de aplicação de instrumentos de base plasmônica para a verificar se há microplásticos na água que, segundo o especialista, “vêm aumentando de maneira significativa nos últimos anos”.
Fonte: Correio Braziliense
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