Apesar de séculos de investigações e progressos na medicina, ainda existem muitos mistérios que permanecem sem solução, sendo o principal deles a compreensão do que causa o envelhecimento e como podemos retardá-lo ou revertê-lo.
Um novo estudo publicado na revista científica Nature pode finalmente ter encontrado as respostas para essas perguntas. Investigadores da Universidade de Colônia, na Alemanha, descobriram que a transcrição do gene – o processo no qual uma célula faz uma cópia de RNA de um pedaço de DNA – torna-se mais rápida com a idade, mas menos precisa e mais propensa a erros, assim como descobriram que certos processos poderiam ajudar-nos a reverter esse declínio.
Antes de Beyer e a sua equipa iniciarem este projeto de investigação, há 10 anos, o estudo típico do envelhecimento “apenas olharia para a expressão diferencial de genes”, diz Beyer. Estudos anteriores, explica, basicamente faziam perguntas como “Quando se envelhece, que genes são ativados e quais são desativados?” e “Como isso muda a regulação ou o metabolismo na célula?”
Mas ninguém perguntou como o próprio processo de transcrição muda à medida que envelhecemos, uma linha de investigação que pode gerar “insights” para nos ajudar a reverter ou parar o declínio.
Transcrição, a chave para um envelhecimento saudável
A transcrição é fundamental para a investigação, pois é o processo no qual uma célula faz uma cópia de RNA de um pedaço de DNA. Essa cópia é importante porque carrega a informação genética necessária para produzir novas proteínas numa célula. As proteínas determinam a saúde e a função das células, e as células então estruturam todos os seres vivos.
“Ao longo das nossas vidas, nossas células regeneram-se, mas cada célula é diferente, e o que as torna diferentes são os diferentes genes que são ativados nela”, explica Beyer. “Essa ativação é chamada transcrição”.
Como os genes dão às células o seu propósito, a sua transcrição precisa ser perfeita. “É preciso criar a quantidade certa de transcrições para cada gene e ter uma cópia exata da sequência do gene, mas também precisa ativar os genes exatos que a célula precisa para funcionar como deveria”, disse Beyer.
Existem muitos tipos diferentes de células no corpo humano: células nervosas, células musculares, células sanguíneas, células da pele e assim por diante. E como cada célula desempenha uma função diferente, um conjunto diferente de genes é ativado (transcrito) em cada tipo de célula.
A “máquina” – como a chama Beyer – responsável por fazer a cópia da transcrição das sequências dos genes é chamada Pol II (RNA polimerase II). E o que sua equipe descobriu foi que o processo de transcrição fica mais rápido à medida que envelhecemos, e essa transcrição acelerada faz com que Pol II cometa mais erros, levando a cópias essencialmente “más” que podem levar a inúmeras doenças.
“Se o Pol II fica muito rápido, ele comete mais erros, e então a sequência não é mais idêntica à sequência do genoma. As consequências são semelhantes às que ocorrem quando há mutações no próprio genoma”, deduz Beyer.
Parar cópias más de células, o segundo grande avanço
Investigações anteriores já haviam comprovado que dietas com poucas calorias e inibir a sinalização da insulina – bloqueando o sinal entre a insulina e as células – poderiam retardar o envelhecimento e prolongar a expectativa de vida em muitos animais. Nas suas experiências, a equipe de Beyer procurou descobrir se eles tiveram algum impacto para diminuir a velocidade do Pol II e reduzir o número de cópias com defeito.
A investigação – uma colaboração conjunta de 26 pessoas, em seis laboratórios diferentes – primeiro trabalhou com vermes, ratos e moscas-da-fruta geneticamente modificados para inibir a sinalização de insulina, bem como com ratos, com uma dieta baixa em calorias para determinar o desempenho da transcrição celular na velhice. Em ambos casos, Pol II reagiu e viajou mais devagar, cometendo menos erros.
Beyer e a sua equipa rastrearam a sobrevivência de moscas-das-frutas e vermes que carregavam a mutação que desacelerou Pol II, e os animais viveram 10% a 20% mais do que os seus homólogos não mutantes. Quando os investigadores usaram a edição de genes para reverter as mutações nos vermes, a expectativa de vida dos animais foi reduzida, estabelecendo uma conexão causal.
Para testar as suas experiências em humanos, eles trabalharam com amostras de sangue de indivíduos jovens e idosos. “E quando comparamos as células jovens com as muito velhas, in vitro, obtivemos exatamente os mesmos resultados”, disse Argyris Papantonis, um dos principais investigadores.
Os resultados das espécies cruzadas confirmam que é “realmente um fenómeno geral que se aplica ao envelhecimento, e não apenas específico a um único modelo de, por exemplo, moscas”, disse Beyer.
Restrição calórica retarda o envelhecimento
“O nosso estudo diz que, por exemplo, ter uma alimentação saudável ou, essa intervenção de restrição calórica, melhoraria a qualidade da transcrição da produção de RNA na célula. E isso teria efeitos benéficos para as células a longo prazo”.
As descobertas podem ajudar a prevenir a manifestação do câncer, observa Papantonis, já que “é uma doença tardia devido a erros. Restringir erros pode ser uma forma de restringir o surgimento de câncer ou doenças tardias”.
Também podem permitir-nos “entender melhor o envelhecimento, entender melhor o que acontece quando envelhecemos” e, finalmente, “entender melhor as intervenções, o que eu acho que abre novas oportunidades para retardar o envelhecimento ou expandir o envelhecimento saudável”, disse Beyer.
Fonte: Euronews
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